quarta-feira, 19 de agosto de 2015

Finjo a vida e finjo a morte.
A vida me escapa;
Na morte, não dei sorte:
Acabei por fingir.
Finjo a palavra no papel,
Finjo que há algo além do céu,
Finjo a ponte do arco, íris
Do teu olho sereno e calmo -
O olho que quis um dia.
Finjo arlequim, finjo colombina.
Finjo amor, finjo alegria.
Fingir, que deu origem à ficção.
Fingir que há um coração
Batendo, e que isso importa.
Fingir que há valor
No sangue da minha aorta,
Que um dia acabará esse bolor.
Finjam comigo que tudo vai dar certo
E que a esperança ta perto,
Que Deus não está no inferno.
Finjam comigo que não é inverno
E que o cravo não brigou com a rosa,
E que ela é infinita,
E que a dor não é aflita,
E que o sofrimento é calado.
Finjam comigo estar ao meu lado,
Nesse eu que é de mim tão absoluto.
Finjam comigo que não é escuro,
Porque fingir é tudo que restou,
E, dentro de mim, nada sobrou.