Um dia eu tentei
parar de escrever e tudo ao meu redor girava como se uma roda-gigante
tivesse tomado o mundo ao meu redor, que girava. Tonto. Eu fiquei.
Zonzo. Eu parei. Vomitei. Voltei. Escrevi.
Se pudesse matar
todos os meus fantasmas, seria considerado algo como um fantasmacida,
um necromante ao contrário, um exorcista de mim mesmo. E dizem que
há algo como um jorro, algo como um gozo, algo como um estupro que
sai agora de um lugar tão alheio a mim que penso ser eu mesmo e nada
faz mais sentido, e tudo faz sentido, e tudo faz. Olhar um jardim
florido, dançar embaixo de uma avelaneira, tomar chá de hibisco –
e o sol, o sol, o sol. Iluminava um ponto que queimava em mim e fazia
um barulho que parecia uma chaleira, que parecia uma panela, que
parecia de pressão, alguma coisa acontece no meu coração. Se eu
fosse mais claro, seria límpido, seria córrego, seria rio, seria
cachoeira. E eu poderia ouvir um rugir, um ronco, uma pedra, um
peixe, os jovens se banhando nas águas do Humaitá, mas eu poderia,
eu não posso. O sol que me iluminava também era eclipse, era
escurecimento, uma nuvem que tapava a peneira por onde escorriam
pequenos fluidos meus, pequenos fios meus, pedaços de minhas unhas,
de meus dedos, de meus cabelos, de minha pele, pedaços de um sujeito
envultado, de um sujeito em vulto. Um vulto. Passando. Se pudesse
matar todos os meus fantasmas, seria considerado algo como um
fantasmacida, um necromante ao contrário, um exorcista de mim mesmo.